DRUNKEN BUTTERFLY

Cultura underground e textos doentios

domingo, janeiro 21, 2007

Mais um conto

Ae! Segue um conto novo em folha para quem gosta...

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TRABALHO

- Tá afim de um cigarro? Pega aí que vai te acalmar !
- Valeu! – respondi
- Sabe, Victor. Estava pensando no teu caso. Qual é o pior pecado que um homem pode cometer? Obviamente, descartando os 10 mandamentos e esta coisa toda?
- Sei lá, matar, deve ser?
- Eu acho – dizia Du – que deve ser fazer algo que a gente detesta, tipo, fazer caixa de banco, estas coisas.
- Deve ser – respondi – mas fazer algo que não gostamos não interfere tanto, como tirar a vida de um coitado aí...
- Engano seu – continuou Du, com as mãos nos bolsos e o cigarro no canto da boca – Quando fazemos algo por obrigação, ficamos mal-humorados, chateados, não damos atenção á patroa, nos irritamos com os amigos, brigamos como os pais, estas coisas..
Apenas grunhi algo e fiquei ouvindo o cara falar. Ele nasceu para a filosofia. Tinha sentimentos nobres, como qualquer destes intelectuais aí. O que lhe diferencia dos demais é o olhar amargo, de quem viu muita merda acontecer. O pouco que sabia sobre ele : só fuma Marlboro vermelho, tem asma, nasceu em Cambará e odeia rotina.
- Tá me ouvindo, animal!? – perguntou ele – Você que pediu uma ajuda, agora fica aí se remoendo como virgem antes de dar para o cara? Se não quer ir junto, cruza a rua e até breve!!!
- Vou junto sim. Tô sendo pago para isso, não tô? – respondi
- Veremos – disse Du, cerrando os dentes e cuspindo o toco de cigarro no meio-fio – É aqui. Deixa que eu falo, só cuida da porta, ok?
Era um botecão destes do Centro, ou seja, sujo, imundo, velho e decadente. O estado do bar estava estampado na cara do dono, que, por causa do calor, só vestia um avental e um calção amarelo. Usava uma alpargata gasta e sebosa. Senti um pouco de nojo, mas fiquei firme, para parecer durão. Não havia ninguém no bar e o velho ouvia seu radinho AM, distraidamente.
- Opa! – saudou Du, se encostando no balcão – vê aquela gelada para nós!
O velho nem respondeu e sacou uma garrafa de cerveja do freezer (sujo, imundo,velho e decadente) e a colocou em um isopor (sujo, imundo,velho e decadente) para não esquentar.
- Seu Ademir? – perguntou Du.
- Sim? – respondeu o velho.
- Conhece o Formiga?
- Que tu quer saber?
- Não devia nada para ele não?
- Combinei que pago hoje à noite, sem falta ! A féria de hoje vai direto para ele.
- Ele tá cansado de esperar, seu Ademir – continuou Du, sem perder a calma, pés em um banco, cerveja no buço e coçando o saco – ele quer agora.
- Veja bem, moço – justificou o velho – negocio com o Formiga há tempos, não vou furar com ele agora? Vou?
- Como vou saber? Que garantia eu tenho?
- O bar, oras! Se não pagar, ele fica com o bar ! – falou o velho.
- Esta espelunca de merda? Acha que o chefe vai querer sujar a barriga no balcão como tu, seu porco.
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PPFFF
Quando me virei para ver o que acontecia, vi o bodegueiro caindo e o Du de arma na mão.
- Apagou o homem, cara! Tu tá louco? – perguntei
- Te fecha, guri. Tu é novato.
Du foi atrás do balcão e pegou uma garrafa de Natu Nobilis. Catou um copo ensebado e o atirou longe.
- Fecha a merda da porta, Victor. Quer que alguém veja o presunto aqui?
Fechei de bom grado a porta do bar. O silenciador que Du usava na arma veio a calhar para deixar o “serviço” mais limpo.
- Vamos embora, Du. Vai dar merda, cara !
Du só sorria. Sorveu o whiskey na garrafa mesmo. “ porcaria de bar, cerveja quente, mosca no chão, blarg...” resmungava. Puxou o velho para os fundos e jogou uma toalha por cima do corpo “para as moscas não cagarem em cima” e pegou outra cerveja.
- Como te dizia – continuou Du – o maior pecado do homem é viver amargurado, fazendo o que não lhe dá prazer. O homem deve buscar um trabalho prazeroso, que lhe dê vontade de sair da cama cedo e pegar no batente.
Ele dizia isto e bebia a cerveja, enquanto sacou outro cigarro.
- Toma!
- Obrigado, agora vamos embora!? – disse
- Arre, mas que cagão tu és! - disse Du – te senta aí, não terminei. Olhe para você : tinha empreguinho garantido e veio parar aqui comigo.
- È a vida, Du.
- Pois lhe digo: rotina para mim é a morte. Horário é um saco! Prefiro fazer esses “bicos”, que bater cartão-ponto todo dia. Isso sim é pecado: jogar sua vida fora, fechado em um escritório ou fábrica, sem ver o sol, sem beber uma cerveja, sem sentir o coração vibrando a cada dia.
- Há homens de todo tipo. Quem sabe este que tu matou pensava como você.
- Pode ser, mas olhe para isto em volta. Um lixo. Certamente ele não gostava desta droga.
- Vai saber...

- Agora vamos que o tempo do parquímetro vai acabar e eu não quero pagar multa

1 Comentários:

Blogger Seu Cossio disse...

Boa! Pelo visto tu também entrou na campanha contra o trabalho (hahahaha).
Muito bom!
Agora vou me afundar nas drogas no festival de rock. Espero voltar vivo....
Abração do irmão MURI.

sexta-feira, 16 fevereiro, 2007  

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